Principais achados e tendências
Os vídeos têm conquistado mais espaço no consumo de notícias, especialmente entre os mais jovens. Na amostra global, vídeos mais curtos são acessados por dois terços (66%) dos respondentes semanalmente, ao passo que vídeos mais longos atingem metade da amostra (51%). [2]
Entre os meios pelos quais as pessoas escolhem se informar, websites de veículos de notícias são os preferidos apenas para 22% dos respondentes, havendo clara preferência por plataformas digitais - sejam redes sociais (incluindo aplicativos de mensageria privada) ou mecanismos de busca e agregação. [3]
A preocupação em distinguir o que é real do que é falso no consumo de notícias online também aparece no relatório: praticamente seis a cada dez respondentes (59%) revelaram tê-la ao navegar online, tendo sido registrado um aumento percentual de 3% em relação ao ano passado. [4] A confiabilidade nas notícias como um todo manteve-se estável no mundo (40%). Enquanto a Finlândia registra o maior nível de confiabilidade geral (69%), Grécia e Hungria posicionam-se em último (23%). [5]
A ocorrência de eleições chegou a influenciar o interesse em notícias em alguns países, todavia a tendência geral é de queda. Enquanto, na Argentina, o interesse decaiu de 77% (2017) para 45% (2024), no Reino Unido, o interesse em notícias reduziu-se quase à metade desde 2015. Como o relatório indica, em ambos os países essa tendência é acompanhada de um desinteresse crescente na política. [6]
O relatório também indica que um cenário de grandes mudanças no ecossistema de plataformas digitais se aproxima, com maior disputa e competição no mercado dada a conquista de espaço por mais players e uma mudança de paradigma tecnológico. [7]
Brasil e o consumo de notícias
Entre os países americanos, o Brasil é o país com o maior nível de confiabilidade: 43% dos consultados pela amostra confiam na maior parte do tempo nas notícias, mesmo percentual registrado em 2023. A fim de comparação, a Argentina atinge a pior marca no continente americano com 30%, ao passo que os Estados Unidos pontuam 32%. [8]
Em 2019, logo após as eleições presidenciais de 2018 (os dados da pesquisa foram coletados em janeiro e fevereiro), o nível de confiabilidade nas notícias marcava 48%, percentual onze pontos menores do que no anterior 2018 (59%), o que revela a forte polarização vivida em meio à onda de desinformação nas eleições de 2018. [9]
Em relação aos anos seguintes, o ano de 2021, primeiro ano com dados coletados durante a pandemia da COVID-19, pontuou 54%, dado inserido na tendência geral vivida na pandemia de maior confiabilidade nas fontes de notícias. [10]
Quando se trata das redes sociais mais utilizadas em 2024 para o compartilhamento de notícias, o Whatsapp lidera com 38% do público da amostra utilizando o aplicativo para tal fim. [11] Um dado que merece ser destacado é que o aplicativo de mensageria privada desponta entre as redes sociais mais utilizadas para compartilhamento de notícias entre todos os países latino-americanos integrantes da pesquisa (ocupando na Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru sempre a segunda ou terceira posição), mas sequer aparece no ranking dos Estados Unidos e do Canadá. [12]
O uso da IA generativa
A ascensão de formatos audiovisuais curtos no consumo de notícias preocupa diante dos incidentes de segurança envolvendo deepfakes. O avanço rápido da inteligência artificial generativa tem tornado os vídeos manipulados mais comuns e refinados, com episódios de graves repercussões se multiplicando.
Poderia a Inteligência Artificial também ajudar na identificação de conteúdos deepfake gerados pela própria IA? Esta parece ser uma boa ideia, mas esbarra no presságio de uma efetividade limitada: essa identificação poderia ser eficiente até que as falhas ou os indícios de falsidade fossem superados pela geração de uma nova leva de conteúdos falsos ou manipulados mais refinada. Assim, é preciso ver com cautela estratégias que se valham de recursos tecnológicos para combater problemas gerados por humanos. Sim, a tecnologia pode ser aliada nesse processo, mas o protagonismo deve ser dos humanos. Nesse sentido, estratégias de educação midiática são fundamentais.
(Mais) Educação midiática já!
Os dados de uma pesquisa publicada pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública sobre o consumo de informações sobre ciência e tecnologia por jovens brasileiros apontam nessa direção. A pesquisa revelou que entre os cinco meios mais acessados por jovens de 15 a 24 anos para informações sobre ciência e tecnologia estão o Youtube, TikTok e Instagram [13], redes sociais que ou focam em conteúdos de vídeo (as duas primeiras) ou os têm priorizado (Instagram). A pesquisa também indica que a divisão entre os jovens quanto à facilidade em identificar notícias falsas quando o assunto é ciência e tecnologia: 53% deles acham que isso é difícil ou muito difícil, ao passo que 46% acham isso fácil ou muito fácil. Comparando esses dados com os de cinco anos atrás, nota-se uma evolução: em 2019, 68% apontavam que fazer essa avaliação era muito difícil. Como a pesquisa pontua, a evolução desse dado pode indicar maior exposição e familiarização com conteúdos desinformativos além de ser fruto de esforços de educação midiática. [14]
Apesar dos avanços, nota-se que o fato de serem nativos digitais não blinda os jovens contra os efeitos da desinformação. Assim, a natividade digital - isto é, a familiarização das novas gerações com tecnologias digitais e seus usos - não vem acompanhada automaticamente de capacidades técnicas e críticas. Desenvolver habilidades como a identificação de conteúdos desinformativos, câmaras de eco e narrativas divisivas e polarizadas exige estratégias contínuas e permanentes de educação midiática e letramento digital. Isso vale não só para os nativos digitais, mas a todos que transitam online e especialmente aos recortes populacionais de maior faixa etária.
Referências
[1] A atual edição coletou dados de 47 mercados informacionais, oferecendo uma amostra de como mais da metade da população mundial tem se relacionado com notícias.
[2] NEWMAN, Nic; FLETCHER, Richard; ROBERTSON Craig T.; ARGUEDAS, Amy; NIELSEN, Rasmus. Digital News Report 2024. Reuters Institute. Oxford: 2024. p. 10
[3] Idem. p. 10
[4] Idem.
[5] Idem. p. 11
[6] Idem. p. 11
[7] Idem. p. 11
[8] Idem. p. 119
[9] KALOGEROPOULOS, Antonis; NEWMAN, Nic; FLETCHER, Richard; ROBERTSON Craig T.; NIELSEN, Rasmus. Digital News Report 2019. Reuters Institute. Oxford: 2024. p. 122, 123
[10] NEWMAN, Nic; FLETCHER, Richard; ROBERTSON Craig T.; NIELSEN, Rasmus; SCHULZ, Anne; ANDI, Simge. Digital News Report 2021. Reuters Institute. Oxford: 2021. p. 117
[11] NEWMAN, Nic; FLETCHER, Richard; ROBERTSON Craig T.; ARGUEDAS, Amy; NIELSEN, Rasmus. Digital News Report 2024. Reuters Institute. Oxford: 2024. p. 119
[12] Idem. p. 114-129
[13] CASTELFRANCHI, YURIJ; FAGUNDES, Vanessa; MASSARANI, Luisa; MOREIRA, ILDEU; MENDES, Ione . O que os jovens brasileiros pensam da ciência e da tecnologia - Survey 2024. Estudo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia (INCT-CPCT): 2024. p. 15
[14] Idem. p. 16
Escrito por Pedro Peres. Pedro Peres é mestrando no Mestrado Europeu em Direito, Dados e Inteligência Artificial (EMILDAI), na Dublin City University e bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2018). Ele é membro do Laboratório de Políticas Públicas e Internet (LAPIN) desde 2020.